Expectativas: elas são suas!


Um dos primeiros passos para conseguir ter uma vida mais plena é reconhecer os próprios sentimentos e como eles se manifestam nas situações do cotidiano. Podemos dizer que o autoconhecimento emocional e sentimental é um dos pilares de uma vida saudável e que, por isso, precisa ser praticado diariamente.


O autoconhecimento, de modo geral, exige uma série de posturas críticas consigo mesmo que garantam não só o julgamento do que se faz, mas também a liberação de alguns perdões, a contextualização de algumas ações que tomamos e a busca por caminhos que conversem com nossas potencialidades em direção à evolução humana. É um processo desafiador, pois exige alguns distanciamentos para melhor compreender os ciclos e vícios que vivenciamos.


Um vício muito comum do ser humano é criar expectativas em relação a tudo e todos. Esperamos e prevemos coisas diariamente. Se entro em uma loja e cumprimento o vendedor, espero que ele responda meu cumprimento. Se eu dou um presente para um amigo, espero que ele agradeça o presente. Se sou cordial com alguém, espero que essa pessoa seja grata por isso. Esperamos incontrolavelmente um retorno para as nossas ações, nem que seja um simples sorriso ou um "obrigado" singelo.


Nem sempre temos consciência que nossas ações foram motivadas pelos nossos desejos pessoais, seja de agradar o outro ou de mostrar que somos educados, simpáticos e cordiais. O sentimento que motivou a ação nasceu em mim e, por isso, ele é meu, somente meu. Logo, o que eu esperava obter de retorno, era uma espera minha, somente minha.


A minha ação diz mais sobre mim do que sobre o outro, logo o outro não tem obrigação alguma de suprir às minhas necessidades e expectativas se não houve um acordo verbal e direto de que haveria uma reciprocidade em tudo que você fizesse por aquela pessoa. Se não há acordo, direto e verbal, o que existem são expectativas individuais que falam mais sobre as suas necessidades do que sobre a obrigação do outro em fazer o que você quer.


É doloroso ler isso, pois muitas vezes só queremos o respeito do outro. Queremos. E o querer é nosso.


Ainda que eu mova todas as montanhas para provar o meu amor por alguém, essa pessoa não é obrigada a estar comigo só porque eu fiz isso. Não é porque fui agradável com os clientes que eles precisam obrigatoriamente ser agradáveis comigo. As expectativas são minhas, reitero. Negar a responsabilidade pelos nossos sentimentos e desejos de confirmação, aprovação e respeito, é terceirizar a culpa e, consequentemente, o responsável pela nossa felicidade.


Marshall Rosenberg, em seu livro "Comunicação Não Violenta", já sinalizava que a negação de responsabilidade é um tipo de comunicação alienante da vida. Quando eu digo que fiz algo porque a pessoa fez tal coisa, na realidade eu estou terceirizando a culpa. Eu fiz porque queria, ou porque despertou em mim um gatilho, ou porque é uma reação relacionada a um trauma pessoal não trabalhado, ou porque eu estou acostumado a ter aquela postura neste tipo de situação... enfim, a sua ação foi impulsionada por um motivo e este motivo reside em você, não no outro. Se aquele trauma estivesse bem trabalhado, talvez você não tivesse reagido daquela forma, por exemplo. Sendo assim, você fez algo porque a sua leitura para a ação do outro estava enviesada nas suas leituras de mundo que te motivaram a agir daquela forma.


O nosso olhar está enviesado, seja pelos nossos traumas ou pelas nossas vivências. 


O desafio para fugir desse olhar enviesado e dessa prática de se frustrar com as próprias expectativas é entender que as pessoas não são obrigadas a fazerem o que você esperava que elas fizessem. O que você espera é um desejo seu, não do outro. Se há uma relação de reciprocidade (em caso de relacionamentos amorosos e profissionais), os acordos e as expectativas precisam ser verbalizadas de modo direto e objetivo, para o outro poder escolher se consegue supri-las ou não. 


Um segundo ponto é, sempre que uma expectativa é frustrada, praticar a autoanálise, questionar-se quais eram os seus desejos pessoais por trás daquilo, se o outro tinha total e plena consciência da postura que você esperava que ele tivesse na situação, caso a resposta seja não, não há motivos para cobrá-lo daquilo que ele não sabia. "Mas é óbvio, Jefferson, a pessoa sabia o que tinha que fazer". Se não foi verbalizado, não é óbvio. Por sinal, o óbvio também precisa ser dito.


Hoje cedo vi uma postagem de uma pessoa no meu Instagram que dizia: evite criar expectativas nas pessoas, pois algumas delas vão te magoar. Eu corrigiria para: evite criar expectativas nas pessoas, pois seus sentimentos e suas esperas podem te magoar. 


E eu já esperei tanto, mas tanto, vivia de esperar. E lentamente vamos percebendo que essa espera gera frustração ao tempo em que nos coloca em xeque internamente, já que passamos a questionar as nossas práticas e as nossas posturas como se fossemos o errado da história ou como se fossemos menos, menos atraente, menos inteligente, menos preparado; enquanto culpabilizamos o outro, como mecanismo de defesa e forma de fugir dos problemas internos não administrados. Quando passamos a esperar menos e entendemos que o outro não tem obrigação de adivinhar o que eu queria que ele fizesse, passamos a lidar melhor com as nossas frustrações, entendendo que ela parte de nossos desejos íntimos, modalizados pelas nossas crenças de vida e traumas; e passamos a buscar uma comunicação mais efetiva, mais direta e objetiva, para que o outro saiba exatamente o que se passa aqui.


O último ponto de desafio é evitarmos ficar presos a arranjos que criamos na nossa cabeça. Se alguém disse algo e aquilo te magoou de alguma forma, não brigue somente porque você se magoou, mas questione a pessoa o motivo dela ter dito aquilo. Pode ser que você descubra que a fala nada tinha a ver com o seu motivo de mágoa, normalmente relacionado a um trauma de vida. E aí, pense comigo: se eu tenho um trauma que surgiu em um relacionamento abusivo, por exemplo, a pessoa que não te causou esse trauma não tem obrigação nenhuma de ter que administrá-lo para você. É cruel isso, mas é real: seus traumas são seus, feitos com arranjos que você criou, baseados em situações que você vivenciou, então se você não tem conseguido administrá-los, o outro não tem culpa disso.


É fácil administrar expectativas? Não mesmo!!! Exige treino diário, uma prática diária de autorreconhecimento para conseguir lidar com suas próprias questões e não projetá-las nas pessoas ao seu redor. Eu pratico há um bom tempo e percebo que a vida segue mais leve, sem tantas cobranças descabidas. E assim vamos levando, não é mesmo?!


Espero que o texto de hoje te ajude a refletir um pouco sobre o modo como você se relaciona com as pessoas ao seu redor. Ele é duro, mas almeja o seu bem-estar (e aqui eu sinalizo uma expectativa minha que você não é obrigado/a a suprir, você tem o direito de escolha de se apropriar do que debato ou ignorar, a escolha é sua!). E a vida é tão curta, não faz sentido viver à base de espera, de expectativas e de frustrações. Vamos nos ajudando e tentando construir uma vida mais plena para nós e para as pessoas ao nosso redor.


Um abraço e até a próxima.

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